Movimento pede transparência na retratação de pesquisas científicas

Os crimes e as contravenções das ciências costumavam ser resolvidos entre quatro paredes, com uma conversa privada no clube dos professores, com questões pouco amigáveis durante conferências, ou com uma negação discreta. Nas ocasiões raras em que uma revista científica retratava publicamente alguma pesquisa, isso geralmente ocorria em uma nota de rodapé pouco clara. Poucos percebiam e muitos estudos descartados continuavam a ser citados como evidências legítimas anos depois do ocorrido.

Mas esse mundo de cavalheiros praticamente desapareceu, conforme uma série de eventos demonstrou no mês passado. Em meados de maio, depois que dois estudantes de pós-graduação questionaram um estudo amplamente divulgado sobre os efeitos de pesquisas políticas sobre as opiniões a cerca do casamento entre pessoas do mesmo sexo, os editores da revista Science, onde o estudo foi publicado, deram início a uma investigação. O que ocorreu a seguir foi uma série de questionamentos, acusações e comentários vindos de todos os cantos da Internet: a retratação se converteu em uma série de drama, ao invés de uma simples nota de rodapé. A revista Science retirou oficialmente a pesquisa feita por Michael LaCour, da Universidade da Califórnia, em Los Angeles, e por Donald Green, de Columbia, no dia 28 de maio, em função das dúvidas acerca dos dados colhidos por LaCour.

“Até bem pouco tempo, era incomum que denunciássemos estudos que ainda não haviam sido retratados”, afirmou o Dr. Ivan Oransky, editor do blog Retraction Watch, o primeiro órgão de imprensa voltado à divulgação de estudos que foram questionados. Mas novas tecnologias e a visão dos cientistas mais jovens sobre a importância da transparência mudaram esse quadro, afirmou. “Recebemos muito mais dicas do que somos capazes de averiguar”.

O caso se destacou em meio a uma série crescente de pedidos de retratação que alarmou muitos editores e autores de revistas científicas. Cientistas de áreas tão variadas quanto a neurobiologia, a anestesiologia e a economia passaram a debater medidas que visam reduzir maus comportamentos, sem gerar uma mentalidade de policiamento que impede a criatividade a colaboração.

“Este é um momento excepcional”, afirmou Brian Nosek, professor de psicologia da Universidade de Virginia, além de um dos fundadores do Center for Open Science, que fornece um serviço gratuito por meio do qual os laboratórios podem compartilhar dados e protocolos. “Estamos testemunhando inúmeros esforços para permitir que os repositórios de dados facilitem a replicação direta de descobertas científicas”.

Mas esse esforço não é bem visto por todos. Alguns cientistas sêniores argumentam que a replicação de resultados frequentemente desperdiça recursos. “A reprodutibilidade não é uma das pedras fundamentais da ciência? Claro, mas só até certo ponto”, afirmou a bióloga e pesquisadora oncológica Mina Bissell em um post que recebeu grande atenção. “Muitas vezes é muito mais fácil ficar sem replicar os estudos”, especialmente quando o grupo que tenta replicá-lo não possui a formação ou as habilidades necessárias para isso.

A experiência do Retraction Watch serve de guia para onde o debate está se encaminhando e porque. Oransky, formado em medicina pela Universidade de Nova York, e Adam Marcus, ambos jornalistas científicos, descobriram um interesse mútuo pelos pedidos de retratação há cerca de cinco anos e fundaram o blog como um projeto paralelo. Eles tinham, e ainda têm, outros empregos: Marcus, de 46 anos, é editor-executivo da revista científica Gastroenterology & Endoscopy News, e Oransky, de 42 anos, é diretor editorial da MedPage Today (ele vai assumir o cargo de jornalista residente na NYU ainda este ano).

Durante o primeiro ano de existência, o blog revelou alguns pedidos de retratação que acabaram chegando à grande mídia – incluindo um caso envolvendo dados criados por um anestesiologista que acabou sendo preso por fraude no sistema de saúde. Atualmente, o site recebe cerca de 150.000 visitantes ao mês, cerca de metade dos quais de fora dos EUA.

Oransky e Marcus atacam com veemência a falta de supervisão e a falta de clareza nos pedidos de retratação. Mas seu foco nas evidências – ao contrário das acusações – os diferenciam de outros blogs que acabam caindo na velha dinâmica dos argumentos ad hominem. No ano passado, o site recebeu uma verba de 400.000 dólares da Fundação John D. e Catherine T. MacArthur, para a construção de uma base de dados própria e os dois planejam trabalhar com Nosek para fazer a gestão desses dados.

Seus dados já contam uma história.

O blog revelou um aumento de 20 a 25 por cento nos pedidos de retratação em cerca de 10.000 revistas médicas e científicas nos últimos cinco anos: chegando a algo entre 500 e 600 pedidos no ano passado, em relação a apenas 400 em 2010. (O número em 2001 foi de apenas 40, de acordo com pesquisas anteriores.) As principais causas para esse aumento estão longe de ser esclarecidas. O número de artigos publicados nunca foi tão alto e as revistas científicas se proliferaram, de acordo com Oransky e outros especialistas. Novas ferramentas para detectar a má conduta, com softwares que identificam plágio, foram amplamente difundidas, por isso, há boas razões para crer que esse aumento seja furto do aumento do volume e da melhoria nas ferramentas de detecção.

Ainda assim, a pressão para publicar dados que chamem atenção nunca foi maior, segundo esses especialistas – assim como a capacidade de “emprestar” e modificar digitalmente os dados. Os arquivos do Retraction Watch sugerem que cerca de um terços dos pedidos de retratação gira em torno de erros, como amostras com problemas ou erros nos cálculos estatísticos, ao passo que outros dois terços se devem à má conduta ou a suspeitas de má conduta.

A razão mais comum para os pedidos de retratação por má conduta é a manipulação de imagens, geralmente figuras e diagramas, uma forma de alterar deliberadamente os dados ou, em alguns casos, de cometer plágio puro e simples. Durante a análise do artigo de LaCour e Green, os dois estudantes de pós-graduação – David Broockman, professor assistente em Stanford, e Joshua Kalla, em California-Berkeley – revelaram que a análise de LaCour era praticamente idêntica a de outro estudo. Essa e outras preocupações levaram Green, que não havia visto os dados originais, a fazer um pedido de retratação. (LaCour negou que tenha tirado proveito de outros dados.)

A alteração dos dados pode ocorrer de inúmeras formas. Ela pode ser feita pela simples exclusão dos “extremos” – pontos de dados estranhamente altos ou baixos – da análise para gerar resultados mais interessantes para comprovar a hipótese. Outra estratégia prevê a análise prévia dos dados, para que determinar posteriormente o objeto de pesquisa, dando a entender que a pesquisa foi realizada com o objetivo de encontrar exatamente aqueles dados. “O pesquisador realiza um estudo genérico e na hora de escrever o artigo dá a entender que sabia desde o princípio o que iria acontecer”, afirmou Nosek.

A segunda principal causa de pedidos de retratação é o plágio, seguido da republicação, ou seja, a publicação dos mesmos resultados em mais de uma revista científica.

A quarta categoria são os dados falsificados. Contudo, ninguém sabe ao certo qual a incidência de problemas. Em uma pesquisa realizada em 2011 com mais de 2.000 psicólogos, cerca de um por cento admitiu ter falsificado dados. Outros estudos estimaram que o total chegue a dois por cento. Ainda assim, uma única pessoa é capaz de causar grandes estragos. O psicólogo social holandês Diederik Stapel publicou dezenas de estudos em importantes revistas científicas por quase uma década com base em dados falsos, conforme os investigadores das universidades onde ele trabalhou concluíram em 2011. As suspeitas foram levantadas pela primeira vez por dois de seus orientandos.

“Se eu sou um cientista, fabrico dados e os coloco na internet, outras pessoas irão presumir que se tratam de dados reais”, afirmou John Budd, professor da Universidade do Missouri e um dos autores de uma das primeiras análises sobre os pedidos de retratação, feita em 1999. “Não dá pra saber” sem informações vindas de dentro.

Neste caso, o Retraction Watch também sugere uma solução possível. Muitos dos piores casos postados no blog são oriundos de dicas. As pessoas que fornecem essas informações fazem parte de um volume crescente de cientistas, jornalistas especializados e outros especialistas que acreditam na missão do blog – e que geralmente não estão diretamente envolvidos nos estudos que denunciam, nem trabalham com os suspeitos. Um dos maiores aliados do blog é o Dr. Steven Shafer, antigo editor da revista Anesthesia, atualmente em Stanford, cuja agressividade na análise de estudos publicados levou a uma série de pedidos de retratação. O campo da anestesiologia é líder nos pedidos de retratação, em grande parte por conta dos esforços de Shafer, segundo Marcus e Oransky. (A psicologia vem em seguida, em grande parte por conta de Stapel.)

Outros casos surgem de questões levantadas em sites de pós-publicação, onde os cientistas analisam estudos, muitas vezes de forma anônima. Broockman, um dos dois estudantes que questionou o artigo de LaCour e Green, levantou algumas de suas suspeitas anonimamente em um fórum chamado poliscirumors.com. Marcus afirmou que o Retraction Watch acompanha de perto um site similar, o PubPeer.com. “Quando esse site apareceu, muita gente achou que seria um espaço de brigas ferrenhas”, afirmou. “Mas embora alguns colaboradores tenham exagerado, acredito que o impacto foi positivo”.

O que denunciantes, revisores anônimos e delatores têm em comum é o faro para dados que parecem bons demais para ser verdade, afirmou. Sites como o Retraction Watch e o PubPeer são um espaço onde eles podem conversar sobre suas preocupações e alertar para dados estranhos.

Espaços como esse e como os repositórios de dados operados por Nosek podem tornar irrelevante o debate sobre como replicar exaustivamente resultados. Esse fardo provavelmente será aliviado pelos esforços da comunidade de farejadores de maus cientistas que possuem cada vez mais material para trabalhar sempre que sentem um cheiro estranho.

“Neste momento, nos vemos como parte de um ecossistema que defende uma transparência cada vez maior”, afirmou Oransky. “E esse ecossistema não para de crescer”.

 

Fonte: UOL

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